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quarta-feira, 30 de dezembro de 2015

Tia Santinha

ADALGISA MIRAGAIA DE OLIVEIRA LEOPOLDO E SILVA

Nome pomposo para uma grande dama, uma das mais cultas pessoas que conheci em minha vida ! Minha tia querida e de memória tão saudosa. Era a filha primogênita de meu avô paterno, Frederico Bicudo de Oliveira e de Maria Eugênia Miragaia, nasceu na cidade de São José dos Campos (SP) em 01 de janeiro de 1914. Sempre foi conhecida e tratada por todos familiares como "Santinha", e assim que a chamei durante toda a vida : Tia Santinha


Era Professora, formada pela Escola Normal de São José dos Campos (Primeira Turma de Normalistas de 1933). Alfabetizou todos os irmãos, praticamente todos os sobrinhos e claro, eu também! Foi no Colégio Oswaldo Cruz, no bairro da Moóca em São Paulo, que aprendi as primeiras letras com essa mulher ímpar ! 

EU NO PRIMEIRO ANO ESCOLAR - COLÉGIO OSWALDO CRUZ

As melhores lembranças de minha infância são ligadas a minha Tia Santinha, e o descobrimento de tanto amor pela arte e cultura através dos livros devo a ela, que sempre me contava histórias lindas (e reais), sobre o Império do Brasil, sobre os Romanovs, sobre os Egipcios...enfim sobre tudo, pois ela realmente conhecia o "mundo" através das leituras que realizava diáriamente. As histórias e os personagens que me eram apresentados, tinham "vida", e acredito que foi o primeiro momento de minha vida que senti que aquelas histórias eram vivas e iam movimentando-se em minha mente com tanta realidade, que eu podia quase tocar aquelas pessoas, graças a eloquência de minha tia ao me contar as histórias. Tenho certeza que foi naquele momento que, mesmo sem saber disso, decidi que iria para o mundo audiovisual, para poder contar para todos aquelas histórias lindas e emocionantes, que somente ela conseguia transmitir com tanta verdade.
ESCOLA NORMAL DE SÃO JOSÉ DOS CAMPOS


Lembro que nas tardes que passava com ela em seu apartamento da Rua General Jardim (SP), em frente ao Teatro Aliança Francesa, ela me deixava folhear suas revistas, já antigas naquela época, e lembro perfeitamente daqueles exemplares do "Jornal das Moças", e passei a conhecer o fascinante mundo do cinema através daquelas estrelas de Hollywood, lindissimas, que estavam estampadas naquelas páginas...Que saudades daqueles tempos!!! Lá conheci Claudette Colbert, Lana Turner, Judy Garland e Deanna Durbin e me apaixonei por toda vida pelo cinema.
CARNAVAL EM S.J.CAMPOS : TIA SANTINHA, TIA MARINA E UMA AMIGA
Também as tardes eram musicais, com ela cantarolando músicas de sua juventude, e sempre lembrando de tudo que tinha passado, com um frescor, como se tudo estivesse acontecendo naquele momento...Quantas vezes a ouvi cantar  "Amando sobre o Mar" ( a valsa de Zequinha de Abreu, que foi sua valsa de formatura no baile da Escola Normal ), e "Italiana" (a valsa de Carlos Galhardo)...como me emocionava com tudo aquilo, e ainda ouço a sua voz cantando "Linda Lourinha", de Silvio Caldas. 


Meus primeiros livros foi ela quem me deu, e como esquecer do Dicionário de Mulheres Célebres com o qual fui presenteado, e eu não tinha nem 11 anos, mas já era apaixonado por história e fascinando pelas grandes mulheres que fizeram a história da humanidade. Sem contar toda a obra dos escritores : Paulo Setubal, Machado de Assis e José de Alencar, que através dela conheci e aos 12 anos, já tinha devorado toda a obra desses autores magníficos. "As Maluquices do Imperador", de Paulo Setúbal, era o meu preferido, que lia e relia, apaixonado pela figura heróica e impetuosa de nosso Imperador Dom Pedro I.

Recordo das tardes tão esperadas por mim, quando a Tia Ismênia Miragaia (prima do Euclides Miragaia, da revolução de 1932, um dos "M" do MMDC) vinha de São José dos Campos para visitas sempre tão radiosas...Saudades...


http://historiadoradiojoseense.blogspot.com.br/2010/01/joseense-euclides-bueno-miragaia.html

Adorava aquelas histórias que ela contava sobre a sua vida pessoal, foi uma mulher que nunca temeu nada e ninguém, e foi a primeira mãe solteira (por vontade própria), da então pacata cidade de São José. Adorava dançar e era considerada uma grande "pé de valsa"...Ainda me lembro dela contando sobre essas histórias e cantarolando sua valsa predileta : "Tardes de Lindóia", do Zéquinha de Abreu. Vez ou outra também vinha a prima Jaú, filha da Tia Ismênia, que era uma das mulheres mais lindas que já tinha visto, me lembrava a Elizabeth Taylor, e eu adorava ficar perto dela, pois me sentia ao lado de uma diva do cinema...rsss....minha vida foi recheada de sonhos "hollywoodianos" !

Tia Santinha era casada com um gentleman, meu tio Arthur Leopoldo e Silva, um verdadeiro Lord inglês, que sempre que chegava uma visita, lá ia ele colocar a gravata e o paletó. Um homem muito fino, sobrinho do Primeiro Arcebispo de São Paulo, Dom Duarte Leopoldo e Silva (em frente a Igreja de Santa Cecília, em São Paulo, tem uma linda estátua desse homem revolucionário). Meu tio era mais calado, mas muito observador, dono de uma cultura extrema. Quantas tardes passei na Sala de Jantar do apartamento deles, apreciando os móveis que tinham pertencido aos pais de meu tio, e tinham vindo de navio da França. Aquilo me fascinava.


Meus primos, filhos de meus tios, eram três : Gabriel, Sérgio e Arthur (Dudú), que sempre foram queridos para mim, e tinha um verdadeiro sentimento de irmão mais novo para com eles...Infelizmente a vida vai nos afastando, e pouco tempo sobra para reavivar as lembranças tão queridas daqueles tempos.

Nunca me esquecerei de minha Tia Santinha, e com certeza apaguei de minha memória a sua morte...Não quero falar, não quero lembrar, não quero recordar aqueles momentos. Me faz mal. Lembro da jovialidade, do sorriso, do olhar sereno e da beleza que sempre manteve. 

Tia Santinha, te amarei sempre ! Obrigado por tudo que fez por mim !

Em tempo : Tia Santinha era fã de Joan Crawford ! Também foi ela que impediu meu avô de colocar em meu pai o nome de Gestras (terrível!), e sugeriu Dimas ! Daí...também devo a ela meu nome.

São Paulo, 30 de Dezembro de 2015

https://pt.wikipedia.org/wiki/Euclides_Bueno_Miragaia

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